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sábado, 24 de maio de 2014

O Problema Textual do Novo Testamento

O Problema Textual do Novo Testamento

Postado na(o) 
  • domingo, 19 de maio de 2013
  •  escrito por 
  • Eduardo G. Junior
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  • O Problema Textual do Novo Testamento

    por Eduardo Galvão

    “A Bíblia alega ser um livro de Deus e ter uma mensagem com autoridade divina. Na verdade, os autores bíblicos dizem ter sido impelidos pelo Espírito Santo a expressar as Suas palavras — que sua mensagem chegou até eles por revelação, de forma que as suas palavras foram sopradas (ou inspiradas) pelo próprio Deus.”(Norman Geisler, 2010, p. 213)

    GREGO, TEXTO, NOVO, TESTAMENTO, PROBLEMA
    Essas palavras descrevem muito bem a crença que os cristãos têm de que a Bíblia, por completa, foi inspirada por Deus, conforme expresso por um dos maiores defensores do Cristianismo na atualidade, Norman Geisler. Não obstante, quando tratamos da doutrina da Inspiração Bíblica, um dos maiores problemas para os cristãos são as cópias feitas depois que os originais foram escritos.

    1§ Introdução

    Os cristãos fundamentalistas dizem que as cópias do N.T., por exemplo, não foram inspiradas por Deus e, nesse caso, é muito simples vermos o motivo disso. Dos mais de 5.000 manuscritos que temos hoje do Novo Testamento, nenhuma deles é igual e todos eles contém milhares de erros de copistas. Portanto, atribuir à Deus um texto repleto de erros e de corrupção literária seria por demais vergonhoso e, já que não temos os originais, podemos facilmente dizer que eles eram isentos de qualquer erro. Dessa forma, a teologia cristã afirma:

    Quando os críticos descobrem um genuíno erro numa cópia (manuscrito) cometem um erro fatal. Eles assumem que o erro se encontra também no texto original das Escrituras, no texto inspirado. Esquecem-se de que Deus proferiu o texto original das Escrituras, não as cópias. Portanto, somente o texto original é isento de erros. A inspiração não garante que toda cópia do original fique sem erros.  (MYATT, ed. eletr.)

    Como foi observado no artigo Bíblia, supostos erros na, isso não quer dizer que todas as cópias e traduções da Bíblia são perfeitas. Deus inspirou os originais, não as cópias, então a inerrância se aplica ao texto original, não a todas as copias.Deus na sua providencia preservou as copias de erros substanciais. Na verdade, o nível de precisão é maior que em qualquer outro livro do mundo antigo, excedendo os 99%. (GEISLER, 2002, p. 121)

    Eu comparo essa tentativa de empurrar a inspiração divina apenas para os originais extintos com a história de um excelente filme chamado, Um Crime de Mestre (2007), com Anthony Hopkins. Aqui vai uma breve sinopse:

    Willy Beachum (Ryan Gosling) é um jovem e ambicioso promotor público, que está no melhor momento de sua vida profissional. Ele tem 97% de vitória nos casos em que atuou e está prestes a assumir um cargo na famosa agência Wooton Sims. Porém, antes de deixar o cargo de promotor ele tem um último desafio pela frente: Ted Crawford (Anthony Hopkins). Após descobrir que sua esposa o estava traindo, Ted a matou com um tiro na cabeça. Parecia um caso simples, já que era um crime premeditado e com uma confissão clara, mas Ted cria um labirinto complexo em torno do caso de forma a tentar sua absolvição. (Adorocimena.com)

    Ampliando ainda mais o enredo, o fato é que a única pessoa que poderia testemunhar contra Ted Crawford (Anthony Hopkins) era a própria vítima que estava em coma; se ela não podia testemunhar, ninguém poderia ser culpado, ou seja, não poderíamos julgar ninguém.

    Da mesma forma, quando os cristãos fundamentalistas dizem que nem as cópias, nem as traduções modernas são inspiradas, mas apenas os originais extintos, fica fácil de entendermos o porquê: os originais se perderam séculos e séculos atrás, estão “em coma” profundo, e, dessa forma, nunca poderemos “interrogá-los” para confirmar ou desmentir o fato de que estes eram inspirados e inerrantes textos sagrados.

    Quando Geisler diz que “Deus na sua providência preservou as cópias de erros substanciais”, gostaria de poder perguntar ao Sr. N. Geisler o seguinte: Se Deus foi tão ativo na preservação de erros “substanciais”, como chama, por que, então, Deus não foi também ativo na preservação do texto por completo, literariamente falando? Fico me perguntando em que momento Deus parou e pensou: “Acho que vou preservar as cópias apenas dos “erros substanciais”, mas o texto mesmo vou deixar errarem.” Isso não faz qualquer sentido! Além disso, essa afirmativa implica em diz que hoje em dia apenas a mensagem da Bíblia está preservada e sem erros e não o texto em si, o que contraria várias outras alas apologéticas cristãs. Apesar de defender veementemente a inspiração bíblica, Geisler admite que “nenhum erudito bem informado nega que certa quantidade de edição ocorreu durante os milhares de anos de historia do texto bíblico.” (Ibidem, p. 118)

    Quando ele usa a frase CERTA QUANTIDADE DE EDIÇÃO, isso significa que as pessoas que copiavam o texto sagrado foram alterando o texto para se harmonizar com o restante da Bíblia, ou com seus próprios pontos de vista teológico. Um exemplo disso pode ser visto no artigo Isaías Menciona Ciro Profeticamente?. Nele mostrei que escribas posteriores acrescentaram trechos nos escritos para fazê-los soar uma profecia genuína. Assim, apesar de confessar que a Bíblia foi editada pelos escribas, e de admitidamente os manuscritos do N.T. estarem cobertos de erros, não obstante, Geisler acredita que a Bíblia moderna continua sendo inspirada por completo, conforme creem o restante dos Evangélicos, Católicos, Testemunhas de Jeová, etc.

    Como isso funciona? Os originais eram inspirados, as cópias posteriores não foram inspiradas, mas a Bíblia moderna é inspirada. Onde fica lógica disso?

    Os apologistas dizem que Deus inspirou os primeiros escritos originais, comunicando aos escritores bíblicos, de forma sobrenatural, Seus pensamentos, Suas leis e os acontecimento futuros para a história da humanidade. (Cf. 2 Tim. 3.16) No entanto, essa inspiração ativa divina foi apenas nos originais, depois, segundo dizem, Deus preservou apenas a mensagem, que continuaria divinamente inspirada. Sobre a própria natureza da inspiração, o teólogo Hopkins diz:


    Inspiração é a influência do Espírito de Deus sobre as mentes dos escritores da Bíblia que fizeram dos escritos o registro de uma revelação divina progressiva, suficiente, quando tomada no seu conjunto e interpretada pelo mesmo Espirito que os inspirou a dirigir cada inquiridor a Cristo e a salvação. (HOPKINS, 2003, p. 293)

    Não obstante, no artigo Teorias da Inspiração Bíblica, mostrei que a própria teologia cristã não está de acordo sobre o que significa dizer que a Bíblia foi inspirada e qual foi o processo de tal inspiração das Escrituras. Voltando mais uma vez para a linha cronológica cristã da inspiração bíblica, somos informados que Deus teria protegido os originais de todo e qualquer erro, quer moral, espiritual, doutrinário e literário. Mas, por algum motivo misterioso, Ele deixou de influenciar esses escritores e escribas, quando fez-se necessário a fabricação de cópias dos originais, motivo pelo qual as cópias do N.T. estão cheias de erros, o que é muito conveniente para um crente fundamentalista.

    Erros genuínos foram encontrados — em cópias do texto bíblico feitas centenas de anos após os autógrafos. Deus pronunciou apenas o texto original da Escritura, não as cópias. Então, apenas o texto original é livre de errosA inspiração não garante que toda cópia seja infalível, principalmente cópias feitas de cópias feitas de cópias feitas de cópias... . Portanto, devemos esperar que erros pequenos sejam encontrados em copias dos manuscritos. (Ibidem p. 130)

    De certa forma, é como se Deus tivesse supervisionado a escrita original, influenciando tudo diretamente, mas depois, quando esses escritos se desintegraram, fazendo-se necessárias cópias de cópias do texto bíblico, Deus se ausentou desse empreendimento literário, por algum motivo misterioso e deixou tudo nas mãos dos copistas humanos e dos crentes que preservaram para a posterioridade a Palavra de Deus no grego original, tudo isso inspirados apenas pelo amor que tinham pelo livro sagrado, Deus não tendo mais nada a ver com o processo de inspiração. No final, creem os fundamentalistas, Deus tocou no coração dos seus servos e esses passam a reunir as inúmeras cópias gregas e latinas e passaram a, de forma sistemática, reconstruir o N.T. grego que havia estado todo deteriorado e desfigurado pelos séculos que se seguiram a redação original. Depois disso, passam a traduzir para as línguas vernaculares e Deus passa a agir novamente, mas agora apenas supervisionando, pois as traduções também não são inspiradas diretamente.

    Quando os fundamentalistas dizem que embora Deus não tenha inspirado as cópias, Ele estava ativo na preservação da mensagem dos textos, me pergunto: Estava mesmo? Bom, que tipo de preservação divina é essa que deixou mais de 5.000 manuscritos gregos todos diferentes um do outro? Como o Deus Todo-poderoso, Criador de todas as coisas poderia estar presente na preservação da Sua Palavra se, no final, ficamos com um texto grego desfigurado, faltando versículos, com inúmeras variações de leitura, com inúmeras traduções e com passagens que até hoje são incertas? Se o Novo Testamento grego está hoje reconstruído em 98% de certeza, e atribuímos isso à Deus, fico imaginando se Deus tivesse criado as coisas cerca de 98% certo, direito; os outros 2% ficaram aonde? Creio na perfeição criacionista de Deus, tanto para criar como para se restaurar. Se a restauração bíblica fosse um milagre divino, teríamos um texto 100% exato e sem qualquer variação textual. Não vemos motivo para o Criador inspirar um livro e depois deixar fazerem com o mesmo o que quiserem.

    2§ O Problema das Variantes

    Variantes textuais, que costumamos chamar, são formas diferentes e até mesmo divergentes de ler o mesmo versículo. Por exemplo, em João 3.3 podemos ler de duas maneiras, tanto pode ser “nascer de novo”, como “nascer de cima”. Isso ocorre porque em alguns manuscritos gregos nós temos “nascer de novo” e em outros temos “nascer de cima”. Nesse caso, o que foi inspirado por Deus? Qual dessas duas frases é a Palavra de Deus? Ninguém sabe! Os exemplos são de perder de vista, pois existem milhares de variantes dentro dos manuscritos do Novo Testamento. O erudito A.T Robertson, um dos maiores especialistas no grego bíblico comentou na passagem acima citada:

    Originalmente “de cima” (Mar 15:38), então “do céu” (Jo 3:31), então “do princípio” (Luc 1:3), e então “de novo” (palin anōthen, Gal 4:9). Qual o significado aqui?

    Apesar de crer relutantemente na inspiração bíblica, Robertson fez uma excelente pergunta: Qual o significado aqui? aqui no versículo de João 3:3? Ninguém sabe! Apesar disso, lemos em outra obra cristã:

    Os eruditos no estudo do NT concordam que dentre as variações encontradas nos manuscritos nenhuma delas afeta o sentido do texto. (MYATT, ed. eletron.)

    Diga-se de passagem que esses eruditos mencionados na citação acima, quando se diz que todos os “eruditos no estudo do NT concordam...”, são todos cristãos ortodoxos que muito antes de seres eruditos, são devotos de fé da religião cristã, o que compromete indubitavelmente suas conclusões. Os apologistas cristãos querem colocar que os erros nos manuscritos são erros que não comprometem o sentido e a mensagem das Bíblia. Mas, serão mesmo erros sem importância? Tome, como exemplo, a doutrina da Trindade, que é uma das mais importantes do Cristianismo. A ala dos estudiosos evangélicos luta contra os estudioso entre as Testemunhas de Jeová em relação a Cristologia no Novo Testamento; em outras palavras, o que o N.T ensina sobre a natureza de Cristo? Seria Jesus o mesmo que Deus ou uma pessoa distinta dEle?

    Para se determina isso, leva-se em conta os textos do N.T. O problema é que os manuscritos dizem coisas distintas nos mesmos lugares e, dessa forma, como saber o que se dizia no original? Tome como exemplo 1 Timóteo 3:16 que diz:

    E, sem dúvida, grande é a controvérsia do mistério da devoção: Deus foi manifestado na carne, justificado em espírito, visto pelos anjos, pregado entre os gentios, crido no mundo, recebido em glória.

    O problema está na leitura “Deus”. Na antiguidade, devido a falta de papel, os escribas começaram a fazer cópias sem espaço de uma palavra para outra e as palavras todas em maiúsculas:

    O uso de abreviações já aparece nas cópias mais antigas do Novo Testamento, provavelmente com objetivo de poupar espaço. Elas eram do tipo contração, suspensão, ligaturas ou símbolos. É importante salientar que as contrações, diferentemente, das outras abreviações, são utilizadas como forma de reverencia ao nome Deus, principalmente no texto hebraico. É notório que essa prática é limitada ao texto bíblico e outras fontes cristãs, mas quando essas palavras estão sendo utilizadas em outro sentido, elas não são contraídas. (GOMES, A História Manuscrita do Novo Testamento)

    Para melhor compreensão desse argumento, é como se nesse processo de abreviação textual do Novo Testamento, os copistas começassem a escrever assim:

    Ex.: DEUSALVOUVC.

    No exemplo acima, o “S” de DeuS foi usado para completar o “S” do verbo “salvar”; além disso, “vc” foi escrito como abreviação de “você”. Menos letras, menos palavras, menos papel gasto, mas a ideia permanece a mesma. O problema é que isso gerou conflitos interpretativos futuros no campo teológico. Imaginem que alguém diga essa frase em inglês:

    E.: GODISNOWHERE.

    Se fôssemos separar essas letras, haveria um grande problema. Dependendo de que forma as separamos, podemos obter duas ideias, uma deísta e outra ateísta.

    Ex.: GOD IS NOW HERE [Deus está aqui agora] ou GOD IS NOWHERE [Deus não está em nenhum lugar]

    Olhando no caso acima, qual é o certo? Quem vai decidir a forma correta de separar as letras e fazer a frase ter sentido? Ninguém sabe ao certo! Tendo isso em mente, vamos prosseguir.

    Em 1 Timóteo 3:16 encontramos as palavras gregas em maiúsculo ΘC, significando tanto “DEUS” bem como “QUE”. Tendo isso em mente, qual é a leitura original? Isso vai depender de seu ponto de vista teológico, as Testemunhas de Jeová, que não acreditam na Trindade traduziram como, “que foi manifestado...” e não “Deus foi manifestado...”, já os trinitaristas acreditam que a segunda forma é a correta.

    Tradução do Novo Mundo, das Testemunhas de Jeová, baseando-se nessa variação textual grega, ao invés de dizer “Deus”, diz “Ele”, se referindo a Jesus Cristo. Dessa forma, segundo essa religião, que não crê que Jesus seja Deus, originalmente o texto grego não continha a palavra “DEUS”, mas sim “QUE”, ou “ELE”, se referindo a pessoa de Jesus. Diferente do que os apologistas dizem, que os erros são de assuntos sem importância, aqui vemos claramente a variante de um texto que muda completamente seu significado de um assunto chave no Cristianismo, a divindade de Cristo. Até hoje existem inúmeras batalhas teológicas sobre o assunto e creio que continuará assim, algo típico do Cristianismo.

    Em uma leitura de 1 Timóteo 3:16, Jesus é Deus e na outra leitura não o é. Isso atacaria diretamente a Cristologia neotestamentária. Uma das primeiras pessoas a perceber esse problema dentro dos textos cristológicos foi o Johan J. Wettstein que, segundo o erudito Bart. D. Ehrman, o levou a repensar suas crenças na inspiração da Bíblia. Ehrman comenta que “Wettstein começou a questionar seriamente suas próprias convicções religiosas” quando se deparou com essa problemática exegética. (EHRMAN, 2006, p. 124) Os estudiosos do NT dependem dos manuscritos para traduzirem o texto grego e estabelecerem o corpo doutrinal do mesmo. Mas, o que fazer quando os cristãos fundamentalistas leem dois manuscritos que dizem coisas distintas no mesmo versículo? Nesse caso, a fé da pessoa é que vai guiar sua mente, para escolher qual provavelmente era a forma no original. Atualmente já foram catalogadas mais 400.000 variações no Novo Testamento (BLOOMBERG, 2011), variações que não se sabe qual é o original.

    3§ Precisão Textual Neotestamentária

    Algumas autoridades no Cristianismo se vangloriam do texto do Novo Testamento ser quase cem por cento exato. Comparando os escritos do NT com outros da antiguidade, lemos:

    Muitos dos grandes clássicos da antiguidade sobrevivem somente a partir de um punhado de cópias manuscritas. De acordo com o grande erudito F. F. Bruce (1910-1991), de Manchester, temos nove ou dez boas cópias da Guerras das Gálias, vinte cópias da História de Roma, de Tito Lívio, duas cópias dos Anais de Tácito, e oito manuscritos da obra História de Tucídides (NTD, 16). Como já vimos, a obra secular mais bem documentada do mundo antigo é a Ilíada de Homero, que sobrevive em cerca de seiscentos e quarenta e três cópias manuscritas. Em contraste, existem milhares de manuscritos gregos do Novo Testamento. O Novo Testamento é, de longe, o livro mais bem atestado do mundo antigo. (GEISLER, 2010, p. 505)

    A obra secular antiga mais documentada é a Ilíada de Homero, sobrevivendo em 643 cópias manuscritas. Contando apenas as cópias gregas, o texto do NT é preservado em aproximadamente 5.686 porções manuscritas parciais e completas que foram copiadas à mão a partir do seculo 11 (possivelmente 1) até o século xv (v. Geisler, cap. 26).” (Idem, 2002, p. 644)< A maioria dos outros livros antigos não é tão bem autenticada. O teólogo do NT Bruce Metzger estimou que o Mahabharata do hinduísmo tem apenas cerca de 90% de precisão e a Ilíada de Homero tem cerca 95%. Em comparação, estimou que o NT é aproximadamente 99,5% preciso. (ibid.). (IdemIbidem)

    “O Novo Testamento é o documento mais confirmado dos tempos antigos.” (CHAMPLIN, 2005, p. 69)

    “Também é verdade que, embora haja 5.000 manuscritos gregos e milhares de traduções em vários idiomas, não existem dois documentos que sejam exatamente iguais.” (Idem, p. 85)

    Um escriba cuidadoso, do evangelho de Mateus, que realmente procurasse evitar variantes, produziria talvez 20 variantes por acidente, descuido, transposição de palavras,homoeoteleuton e homoeoarcteton, sinônimos, haplografia, etc. Um escriba descuidado, que copiasse um livro do tamanho do evangelho de Mateus, facilmente produziria várias centenas de variantesAlguns escribas modificavam propositalmente passagens que se adaptassem às suas doutrinas preconcebidas, e muitos deles «harmonizavam» passagens, especialmente entre os evangelhos e entre Colossenses e Efésios. (Idem e Ibidem)

    Como observado acima, pelo próprio Geisler, praticamente todo livro sagrado, seja no Hinduísmo, Budismo, Helenismo, tiveram sua preservação textual em no mínimo 90% de certeza literária com os originais. Que diferença faz que o livro sagrado dos hindus seja 90% exato e o NT seja 98%?

    Na verdade, eu vejo por outro ângulo: Por que todos os livros sagrados, pelo menos os principais, foram preservados tão acuradamente, estando todos na casa dos 90% de acuidade, mesmo tendo séculos de existência? Simples, porque esses textos foram escritos e preservados por pessoas devotadas, pessoas que realmente acreditavam na inspiração de seus respectivos textos sacros. Dessa forma, o que preservou o texto em si não foi uma entidade sobrenatural, mas a devoção humana material.

    4§ Onde Estão os Versículos?

    Quando era Testemunha de Jeová, usava a Tradução do Novo Mundo como Bíblia devocional. Uma das coisas mais incomodas que havia aprendido era em relação aos versículos que estavam faltando na Bíblia. Talvez seja novo para você, caro leitor(a), mas mesmo depois que o NT foi restaurado, alguns versículos ficaram ainda com lacunas sem preenchimento textual, assim, muitas versões da Bíblia colocam um tração onde está faltando a palavra. Levando isso em mente, eu razoava: “Se Jeová realmente preservou a Bíblia, onde estão aqueles versículos que faltam? se perderam no tempo?”

    Um dos exemplos que poderíamos citar é Mateus 7:20-22. Abra sua Bíblia nessa referência, provavelmente terá alguma coisa do tipo:

    20 E Jesus lhes disse: Por causa da vossa pequena fé; porque em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá-e há de passar; e nada vos será impossível. 21 Mas esta casta de demônios não se expulsa senão pela oração e pelo jejum. 22 Ora, achando-se eles na Galileia, disse-lhes Jesus: O Filho do Homem será entregue nas mãos dos homens,...

    No entanto, se abrir a Tradução do Novo Mundo, encontrará isso:

    20 Ele lhes disse: “Por terdes pouca fé. Pois, deveras, eu vos digo: Se tiverdes fé do tamanho dum grão de mostarda, direis a este monte: ‘Transfere-te daqui para lá’, e ele se transferirá, e nada vos será impossível.” 21 —— 22 Foi quando estavam ajuntados na Galiléia que Jesus lhes disse: “O Filho do homem está destinado a ser traído às mãos dos homens,...

    Perceba que na TNM não encontramos o versículo 21 (o mesmo ocorre com a Bíblia de Jerusalém). Isso ocorre porque o mesmo não se encontra nos melhores e mais antigos manuscritos gregos, o que significa que o versículo 21 do capítulo 17 do Evangelho de Mateus, que era originalmente parte da Palavra de Deus, se perdeu para sempre.

    Poderia citar aqui vários exemplos, mas gostaria de mencionar apenas mais um, no chamado Comma Johanneum, que se encontra em 1 João 5:7-8. Observe ele nos manuscritos originais e nas traduções da Bíblia moderna:

    Latim: quoniam tres sunt qui testimonium dant in caelopater verbum et spiritus sanctus et hi tres unum sunt et tres sunt qui testimonium dant in terraspiritus et aqua et sanguis et tres unum sunt

    Grego: οτι τρεις εισιν οι μαρτυρουντες εν τω ουρανω ο πατηρ ο λογος και το αγιον πνευμα και ουτοι οι τρεις εν εισιν και τρεις εισιν οι μαρτυρουντες εν τη γη το πνευμα και το υδωρ και το αιμα και οι τρεις εις το εν εισιν

    Português: Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. E três são os que testificam na terra: o Espírito, e a água, e o sangue; e estes três concordam num.

    Diferença de alguns textos gregos padrão:


    Westcott/Hort com Diacríticos

    ὅτι τρεῖς εἰσιν οἱ μαρτυροῦντες, [palavras omitidas]

    Greek Orthodox Church

    ὅτι τρεῖς εἰσιν οἱ μαρτυροῦντες ἐν τῷ οὐρανῷ, ὁ Πατὴρ, ὁ Λόγος καὶ τὸ ἅγιον Πνεῦμα, καὶ οὗτοι οἱ τρεῖς ἕν εἰσι.

    Tischendorf 8th Ed. with Diacríticos

    ὅτι τρεῖς εἰμί ὁ μαρτυρέω... [palavras omitidas]

    Stephanus Textus Receptus (1550)

    ὅτι τρεῖς εἰσιν οἱ μαρτυροῦντες εν τῷ οὐρανῷ, ὁ πατήρ, ὁ λόγος, καὶ τὸ Ἅγιον Πνεῦμα• καὶ οὗτοι οἱ τρεῖς ἕν εἰσιν

    Byzantine/Majority Text (2000)

    οτι τρεις εισιν οι μαρτυρουντες... [palavra omitidas]

    Textus Receptus (1894)

    οτι τρεις εισιν οι μαρτυρουντες εν τω ουρανω ο πατηρ ο λογος και το αγιον πνευμα και ουτοι οι τρεις εν εισιν

    Greek Study Bible (Apostolic / Interlinear)

    ὅτι τρεῖς εἰσιν οἱ μαρτυροῦντες, [palavras omitidas]

    Traduções em Português:

    Almeida Revisada e Corrigida (1995) :

    “Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um.”

    Bíblia de Jerusalém (2006):

    “Porque três são os que testemunham: o Espírito, a água e o sangue, e os três tendem o mesmo fim.”

    Nova Versão Internacional (2000):

    “Há três que dão testemunho: o Espírito, a água e o sangue; e os três são unânimes.”

    Esta versão está de acordo com os textos gregos de C. Tischendorf (oitava ed., 1872); Westcott e Hort (1881); Augustinus Merk (nona ed., 1964); José Maria Bover (quinta ed., 1968); UBS; Nestle-Aland. Depois de “os que dão testemunho”, os mss. cursivos N.o 61 (séc. 16) e N.o 629 (em latim e em grego, séc. 14 a 15), bem como Vgc acrescentam as palavras: “no céu, o Pai, a Palavra e o espírito santo; e estes três são um. (8) E são três os que dão testemunho na terra.” Mas estas palavras são omitidas por אABVgSyh,p.

    A respeito desta passagem trinitária, o crítico textual F. H. A. Scrivener escreveu:

    Não precisamos hesitar em declarar a nossa convicção de que as palavras controvertidas não foram escritas por São João: que foram originalmente transpostas da margem para as cópias latinas na África, onde haviam sido colocadas como nota explicativa pia e ortodoxa referente ao versículo 8 de 1 João 5 : que, do latim, penetraram em dois ou três códices gregos posteriores, e daí no texto impresso em grego, lugar a que não tinham nenhum direito. (SCRIVENER, 1883, p. 654).

    A obra A Bíblia Explicada diz: “Nos versículos 7, 8 de 1 João 5 devemos omitir as seguintes palavras: “No céu, o Pai, a Palavra, e o Espírito Santo; e estes três são um. E três são os que testificam na terra”, por não se encontrarem nos melhores manuscritos.” — (MCNAIR, 1985, p. 489)

    Alguns traduções, no entanto, preenchem essas lacunas com adições posteriores que não faziam parte do texto original do Novo Testamento, colocado trechos da tradição oral, ou complementando com alguma ideia teológica. Algum escriba cristão trinitarísta quando leu 1 João 5:8 percebeu que a ideia de três coisas dando testemunho e estando de ACORDO, poderia muito bem expressar a ideia da Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, os três estando de acordo, ou seja, sendo a mesma essência divina.

    Hoje em dia, temos centenas de traduções da Bíblia, na grande maioria delas, os próprios cristãos confessam que são encontrados inúmeros erros, manipulações textuais, corrupção dogmática, o que eles chamam de “heresia”. A própria Tradução do Novo Mundo, usada pelas TJs é considerada uma Bíblia totalmente deturpada pelas demais denominações cristãs. Uma outra tradução da Bíblia que recebeu profundas críticas e mesmo assim é bastante usada é a Bíblia de Estudo Dake. Veja os sites: Bíblia de Estudo Dake - Erros DoutrináriosAs Heresias da Bíblia de Estudo DAKE

    5§ Redescobrindo a Natureza Textual

    Ao analisar o problema textual do Novo Testamento, as manipulações feitas ao texto, podemos resumir na seguinte forma equacionária: (?) + mss. (erros, manipulações corrupção, versículos perdidos = PRODUTO HUMANO) + trad. (tendenciosa, manipulada, errônea = PRODUTO HUMANO) = (?)

    Ora, temos dois sinais (?) para definirmos a natureza da Bíblia. No primeiro (?) temos o que seria a natureza dos originais, os autógrafos, que foi representado pela interrogação, uma vez que não os temos nas mãos para análise, fazendo com que sua real natureza seja uma incógnita  No Segundo (?) temos a natureza da Bíblia moderna, da qual estamos tentando definir. Para resolvermos essa equação, precisamos restaurar a natureza do fator (1 - ?), que somados aos outros dois fatores, dos quais temos provas empíricas, mss. + trad., nos levará ao resultado (2 - ?)

    Se os mais de 5.000 manuscritos foram produto das mãos humanas, sem qualquer intervenção divina, como dizem os próprios cristãos (GEISLER, 2002), e se as traduções da Bíblia que temos hoje são admitidamente produto das mãos humanas e das correspondentes ramificações teológicas, não seria de se esperar o que o mesmo aconteceu com os originais? Que, assim como as cópias, e assim como as traduções modernas, os originais também continham erros e que eram nada menos que um produto das mãos humanas?

    Sinceramente, vejo claramente que os copistas eram humanos, tentando salvar um texto que, para eles, tinha muito significado espiritual, mas que, motivados por suas convicções religiosas, mudavam o texto bíblico ao seu bel-prazer; por isso, então, as mais de 400 mil variantes encontradas no Novo Testamento grego. O mesmo aconteceu e ainda acontece com as traduções modernas da Bíblia. Encontramos centenas delas porque nem mesmo os cristãos estão de acordo em relação aos muitos versículos. O próprio trabalho de tradução da Bíblia é apenas um trabalho humano, feito por homens que acreditam que ela é de autoria divina. No entanto, seus erros e discrepâncias ao traduzir o texto bíblico prova que não há qualquer força espiritual por trás disso, que o trabalho de tradução da Bíblia é puramente humano, tanto quanto provavelmente foi sua composição original.

    Por último, mas não menos importante, pensamos nos originais, cuja produção literária não foi diferente do trabalho dos copistas e depois dos tradutores. Os escritores bíblicos dos originais eram também seres humanos imperfeitos,[1] que tinham seus ideais, que descordavam até mesmo de seus próprios irmãos na fé[2] e que usavam seus escritos para corrigir o que para eles era herético. [3] Assim, levando tudo isso que falamos em consideração, basta usarmos a Navalha de Occam e acharemos a natureza dos originais e a natureza da Bíblia em sua edição final canonizada.

    Se admitidamente as cópias possuem centenas de erros, se as traduções da Bíblia até hoje são manipuladas pelas inúmeras denominações cristãs, o que provavelmente ocorreu com os originais? qual provavelmente foi sua forma na redação original? A resposta é que com enorme probabilidade, esses textos eram tão cheios de erros como eram suas cópias e traduções modernas. Assim temos:

    Autog. (erros, manipulações) + Mss. (erros, manipulações  corrupção, versículos perdidos: PRODUTO HUMANO) + Trad. (tendenciosa, manipulada, errônea: PRODUTO HUMANO) = Natureza da Bíblia (Produto Literário Humano)

    6§ Conclusão

    Portanto, concluo que, assim como o trabalho dos copistas e dos tradutores foram feitos sem qualquer inspiração sobrenatural, mas era apenas um empreendimento humano-literário, creio que o mesmo se deu com os originais. Os textos autógrafos são o produto da devoção e religiosidade de um povo que sempre acreditou ser especial e usado por Deus como Seu oráculo para o mundo. (Romanos 3.2)





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    NOTAS:

    [1] Menciono especificamente Pedro por negar seu próprio mestre 3 vezes, de acordo com o relato evangelístico em Mateus 26:33-35, Marcos 14:29-31, Lucas 22:33-34 e João 13:36-38.
    [2] Tome como exemplo três personagens do Novo Testamento: Pedro, Paulo e Tiago. Paulo criticou o apóstolo Pedro fortemente no que se refere aos ensinos cristãos e Tiago atacou fortemente a teologia paulina sobre a justificação.
    [3] Em sua epístola, Judas faz uma apelo aos irmãos e milita fortemente contra falsos irmãos que estavam deturpando os ensinos cristãos antes mesmo do cânon do NT ter sido concluído.

    Outros Artigos:

    Bibliografia de Sites:

    Most Important Textual Variants in the New Testament acessado em 18/05/2013
    400,000 Textual Variants in the New Testament Alone? acessado em 18/05/2013
    Center for the Study of New Testament Manuscripts acessado em 16/05/2013
    Johannine Comma (Wikipédia) acessado em 19/05/2013
    Johannine Comma (Theopédia), acessado em 19/05/2013.
    Comma Johanneum, acessado em 19/05/2013.
    O Que a Bíblia Diz? I João 5:7 e 8, acessado em 19/05/2013.
    List of Bible Verses not Included in Modern Translations, acessado em 19/05/2013.
    The Johannine Comma, acessado em 19/05/2013.
    Manuscript evidence for Superior New Testament Reliability, acessado em 16/05/2013.
    Is the New Testament Text Reliable? acessado em 16/05/2013.

    Bibliografia de Livros

    GEISLER, Norman. Teologia Sistemática. 1 ed. Vol. 1. Rio de Janeiro. CPAD. 2010.
    MYATT, Alan. FRANKLIN, Ferreira. Teologia Sistemática. Ed. Eletrônica. Rio de Janeiro. Vida. 2002.
    GEISLER, NORMAN. Enciclopédia Apologética. São Paulo. Vida. 2002.
    STRONG, Augustus Hopkins. Teologia Sistemática. São Paulo. Hagnos. 2003.
    EHRMAN. Bart, D. O Que Jesus Disse e o Que Jesus Não Disse. Rio de Janeiro. Agir. 2005.
    ROBERTSON, Archibald Thomas. Word Pictures of the New Testament.Broadman Press 1960.
    SCRIVENER, F. H. Ambrose. A Plain Introduction to the Criticism of the New Testament. Cambridge, 1883.
    McNAIR, S. E. A Bíblia de Estudo Explicada. Rio de Janeiro, Brasil, 1985.
    CHAMPLIN. R.Norman. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. São Paulo. Hagnos. 2005.
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    Item Reviewed: O Problema Textual do Novo Testamento Rating: 5 Reviewed By: Gabriel Orcioli